terça-feira, 26 de junho de 2007

A ressaca do ecstasy

do site da CARTA CAPITAL
por Phydia de Athayde
Estudo inédito analisa os efeitos sobre usuários no intervalo de cinco anos

Se você tomar uma dessas pílulas, sentirá a música de uma maneira totalmente nova, o corpo energizado, uma vontade de abraçar todo o mundo e, no dia seguinte, ficará meio deprimido. Esse é o ciclo básico de uma experiência com ecstasy e resume boa parte do que se sabe sobre o uso da droga. Mas o que acontece com os usuários anos depois? Um estudo sem precedentes no mundo tem a resposta e acaba de ser concluído. O psicólogo Murilo Battisti, pesquisador da Universidade Federal de São Paulo, acompanhou um grupo de usuários em um intervalo de cinco anos e identificou não só padrões de consumo, mas também o que leva alguns a abandoná-la e outros a manter ou substituir a pílula pela cocaína. Com exclusividade para CartaCapital, detalhes e conclusões do estudo.

A pesquisa é um acompanhamento da história natural do uso de ecstasy. Battisti é estudioso do consumo de drogas sintéticas no Brasil e descreve o perfil do usuário. “O principal contexto de uso está ligado à cena da música eletrônica. O usuário é o jovem adulto, de classe média a alta, consumidor de outras drogas (lícitas e ilícitas) e com baixa percepção dos riscos do ecstasy”, explica.

Nesse espectro, Battisti identificou dois grupos. De um lado, a “geração rave”, universitários que consumiam a droga há dois ou três anos, geralmente em raves e clubs, em doses pequenas (de meio a dois comprimidos) e de forma esporádica. Do outro, o “mundinho da noite”, profissionais das festas e casas noturnas movidas a música eletrônica (DJs, promoters, hostess etc.) que consumiam a droga há cinco anos, geralmente em clubs, em doses altas (de dois a seis comprimidos) e com muita freqüência.

No intervalo entre 2001 e 2006, para os universitários a droga ou desapareceu ou seu consumo diminuiu para menos da metade. “Esse grupo passou a assumir papéis adultos na vida e tomar ecstasy perdeu o sentido”, diz Battisti, que classifica este como um padrão transitório de uso da droga. Os oriundos da geração rave apontaram, com o tempo, mais preocupação com a saúde e melhor percepção dos riscos do ecstasy.

No grupo da noite, por sua vez, o ecstasy continuou, com uma tendência à moderação na quantidade e ao retorno à cocaína (que já consumiam). “A vida desse grupo mudou pouco e, para eles, tomar ecstasy é quase uma conseqüência do trabalho”, analisa o pesquisador. Este grupo mencionou, depois de cinco anos, o aumento dos efeitos adversos – como a depressão – e a má qualidade da pílula como desestímulos ao consumo.

Um único usuário aumentou o consumo. De perfil “geração rave” (75% dos pesquisados), o jovem apresentava sinais de uso compulsivo em 2001 que se confirmaram em 2006. Ele é fisicamente dependente de ecstasy, um fato raro no uso da droga.

A pesquisa de Battisti é qualitativa e não deve ser avaliada por números absolutos. O grupo estudado teve 32 usuários na primeira etapa e 21 na segunda, pois alguns perderam contato e outros não quiseram prosseguir. “A amostra é numericamente pequena, mas é possível fazer inferências na população porque os perfis se repetem na sociedade”, explica.

Não há dados quantitativos sobre consumo de ecstasy no Brasil e as estimativas são feitas a partir de apreensões feitas pela Polícia Federal. Entre a primeira e a segunda etapa da pesquisa, elas tiveram um aumento substancial (de 1.909 para 19.094 comprimidos). De janeiro a maio deste ano, a apreensão já passa de alarmantes 171 mil unidades. Embora isso possa ser reflexo de maior eficiência nas operações policiais, é razoável supor que haja um aumento na demanda. Todos os anos o Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC) divulga o Relatório Mundial das Drogas. As informações relativas ao Brasil vêm dos números da PF. A edição de 2007 sai no dia 26 deste mês e, provavelmente, alertará para o aumento do consumo de ecstasy no País.

Não é difícil encontrar usuários e ex-usuários em grandes núcleos urbanos como São Paulo. A figurinista paulistana Karina, de 30 anos, usou a droga como transição para a vida adulta. Começou a tomar ecstasy aos 23. “Foi fase, coisa de moleca. Eu ganhava grana, saí de casa e tinha um namorado que tomava muito. Eu ia na dele, usava várias drogas e tomava bala (ecstasy) todo fim de semana, de três a cinco por noite, em clubes de música eletrônica”, diz.
No auge do consumo, Karina começou a sentir mais “crises de choro, sensação de morte”. Procurou um psiquiatra, foi diagnosticada com depressão e tratou-se por seis meses. “Resolvi colocar minha vida em ordem. Mudei de profissão, decidi cursar moda, voltei para a casa dos meus pais, terminei aquele relacionamento”, relata. Hoje Karina não quer mais saber da droga: “Não uso nem maconha. Tenho outras motivações, amo meu trabalho, gosto de acordar cedo, ter a cabeça ativa. Não me interessa mais estar fora do ar”. Do antigo namorado, más notícias. Ele tornou-se dependente de cocaína. “Aquele lá se perdeu para sempre”, diz ela.

O psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira coordena o Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (Proad) da Unifesp e descreve uma sensação comum a quem toma ecstasy: “No início relatam efeitos fantásticos. Depois aumentam os problemas, e eles sempre esperam reviver aquela primeira sensação”.

Silveira diz que a dependência de ecstasy é rara. A médio e longo prazo, acredita-se que a droga provoca depressão e transtornos psíquicos ansiosos, como síndrome do pânico e fobia social, em usuários com predisposição. “Mesmo sem a droga, a maioria ainda terá de tratar os problemas por ela desencadeados”, alerta. Na parcela sem predisposição aos transtornos, ele acredita que o ecstasy possa ter papel semelhante ao da maconha. “Grande parte abandona o uso depois de alguns anos e segue a vida”, diz, mas ressalta que “há pessoas viciadas em um estado alterado de consciência, usuários compulsivos de qualquer droga”.

A pesquisa de Murilo Battisti trata de usuários contumazes em 2001. Desde então, o consumo da droga ganhou novos contornos. “Esse estudo é relevante por nos dar diretrizes para pensarmos medidas de saúde pública adequadas”, afirma Ana Regina Noto, pesquisadora do Centro Brasileiro de Informação sobre Drogas (Cebrid) e orientadora do doutorado de Battisti.
Ainda que indique que a maior parte dos usuários abandonou ou reduziu o consumo do ecstasy, as conclusões de Battisti não são amenas. “Muito do impacto negativo passa despercebido e muitas vezes não é associado ao ecstasy”, diz, referindo-se a problemas psiquiátricos. “O ecstasy deixou de ser uma novidade. Passou a ser mais uma droga do arsenal”, conclui.

Leia na edição de CartaCapital que já está nas bancas a polêmica suspensão do financiamento do projeto Baladaboa, que informa usuários dos riscos da droga

segunda-feira, 25 de junho de 2007

Ainda sobre os ataques de Reinaldo Avezedo


Carta enviada pelo pesquisador Alexandre Varella,

Mas as drogas, esses monstros assustadores... tudo acaba em caso de polícia, contra os "fora da lei" que usam drogas "ilegais". Que coisa mais boba, se não fosse pelas consequências políticas e sociais, como os assassinatos de pessoas (pela justificativa de que usam e vendem drogas) pela polícia e sua "lei"antinarco, além de outros impasses que cria, como é o cancelamento de financiamento da política de reduçãode danos ou de outras pesquisas sociais e acadêmicas.Saindo do simplismo (e efetividade) da "lei positiva", o douto em português não pode usar outro argumento por muito tempo no seu discurso (direto de direita) contra as drogas. Argumentos de saúde pública (ou privada) contra as substâncias, é ilustrativo, este senhor apenas os utiliza em breves digressões, logo abandonadas pelo parecer de que ecstasy ou cocaína é crime. Reinaldo, este acecla da Veja, sabe muito bem que o argumento contra as drogas, pelo motivo do dano à saúde (pública e privada), daria muito mais trelapara criar uma lei de proibição do álcool e do cigarro, do que para manter proibidos o ecstasy, o ácido ou a cocaína. Mas isto, é claro, não aparece emseu bom português para inglês ver.
Este senhor se incomoda mais com o cheiro da maconhaque com o do tabaco, como ele mesmo comenta. Mas hácontrovérsias. Proibamos ambos ou nenhum fumo. Senão, o que se cheira é a hipocrisia dos que estão na "lei", de convenção de senhores que cheiram a tabaco e não suportam os que cheiram a maconha. Portanto, a luta é de "classe". Onde estão tais e quais drogas? Elas projetam a luta de grupos sociais, e de indivíduos,com distintos saberes e práticas, distintos projetosexistenciais e políticos. Que viva a informação como um "direito natural". O saber usar (pela experiência e pela educação) é que faz a diferença entre o dano maior e o dano menor, ouo benefício maior ou menor no consumo das drogas. O senhor Reinaldo sabe disso quando bebe e fuma? Ele escreve seus brilhantes textos durante, antes oudepois de fumar e beber? Se fosse melhor informadopela política de redução de danos, saberia comoaproveitar mais suas drogas em relação a seu ofício.Talvez, as drogas tenham alguma influência na suamaneira livre e solta de escrever, ao pé da letra, odiscurso dos embriagados pelo poder de repressão àsdrogas (as que ele declara não usar). Ele só usa o que é legal. Que cara bacana.

REDUC NA MTV

quarta-feira, 20 de junho de 2007

GESTORES DE SAÚDE E ATIVISTA CONSIDERAM REPORTAGEM DE JORNAL TENDENCIOSA E DIZEM QUE PANFLETO DE REDUÇÃO DE DANOS NÃO INCENTIVA USO DE DROGAS


Panfletos de redução de danos são para públicos específicos e a política existe desde de 1998. Estas foram as principais justificativas de ativista e gestores de saúde ouvidos pela reportagem sobre a polêmica divulgada pelo jornal Folha de S.Paulo: Panfleto para a Parada Gay orienta como cheirar cocaína. A maioria criticou a publicação por ter destacado apenas os pontos negativos sobre o assunto e ponderou que o texto do material gráfico poderia ser melhor redigido.
“O folheto é dirigido a um público específico, de acordo com a política de redu
ção de danos. Ele poderia ser redigido de melhor forma, mas não incentiva o uso de drogas”, disse Maria Clara Gianna, coordenadora do Programa Estadual de DST/Aids de São Paulo.

A gestora de saúde informou ainda que o texto do folheto não foi submetido à análise do órgão estadual. “Destinamos verbas à Parada e eles decidem como alocar os recursos e como produzir os materiais gráficos”, explicou.

Maria Clara disse que o jornal poderia ter destacado também os pontos positivos sobre a política de redução de danos.

“O jornal deu um peso muito grande para uma ação específica. O governo federal apóia as iniciativas de redução de danos e acho que o panfleto não fere a lei, só poderia ter um texto melhor redigido”, ponderou o diretor-adjunto do Programa Nacional de DST/Aids, Eduardo Barbosa.

“Depois de mais de 20 anos de Aids, ainda se mantém essa visão conservadora em relação à saúde pública. Deveríamos estar em outro nível de discussão sobre redução de danos. É uma postura muito retrógrada achar que informar é ensinar ou incentivar a utilizar drogas”, disse a vice-presidente do Reduc (Rede Brasileira de Redução de Danos e Direitos Humanos), Daniela Trigueiros.

Já a Associação Brasileira de Redutores e Redutoras de Danos, Aborda, divulgou nota criticando o jornal. “Longe de qualquer tipo de incentivo à drogadição, o que se defende é que as ações de promoção de saúde devem levar em consideração a realidade, e não nossos desejos de um mundo ideal e perfeito. Não obstante, as declarações impressas nas páginas da Folha parecem falar de um mundo no qual todos bebem água pura, comem legumes e verduras e fazem exercícios regulares. Não obstante, sabemos que a realidade é diferente. As pessoas, independente de gostarmos disto ou não, são adeptas de diversas práticas insalubres; é com esta realidade que devemos nos relacionar, e não com uma fantasia ideal e inexistente.”, afirmou a organização não-governamental.


Rodrigo Vasconcellos e Maurício Barreira

PROGRAMAS NACIONAL E ESTADUAL DIVULGAM NOTA OFICIAL SOBRE PANFLETO QUE GEROU POLÊMICA

A notícia, publicada inicialmente pelo jornal Folha de S.Paulo, repercutiu na imprensa pelo Brasil inteiro e virou pauta no Jornal Nacional da Rede Globo. No final da tarde de sexta-feira, uma nota de esclarecimento assinada por Mariângela Simão, diretora do Programa Nacional de DST/Aids e Maria Clara Gianna, coordenadora do Programa Estadual de São Paulo, exemplificam com dados os bons resultados que o país conseguiu entre os usuários de drogas injetáveis com a adoção da política de reduçao de danos e apóia a decisão da Associação da Parada que resolveu suspender a distribuição do panfleto. Abaixo a nota na íntegra:


A respeito das informações sobre uso de drogas contidas no panfleto “Tenho orgulho e me cuido”, produzido pela Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo, esclarecemos que:

- A estratégia de redução de danos é comprovadamente eficaz, do ponto de vista de saúde pública. Desde que passou a ser adotada pelo Ministério da Saúde, em 1994, observa-se uma forte mudança no perfil da epidemia da Aids no Brasil. Em 1994, 21,4% dos casos de aids notificados no país tinham relação direta ou indireta com o uso de drogas injetáveis. Em 2006, essa relação foi de 9,8%.

- Nesse período, o número de casos da doença em usuários de drogas injetáveis (UDI) caiu em 70%. Em 1995, foram notificados 4.661 casos. Em 2005, foram 1.418.

- Estimativas demonstram que há cerca de 193 mil UDI no Brasil, dos quais 76% fazem parte de algum programa de redução de danos. Atualmente, no Brasil, existem 138 Centros de Atenção Psicossocial especializados no atendimento de dependentes de álcool e outras drogas, que também desenvolvem trabalhos de redução de danos.

- A estratégia de redução de danos também se mostra eficaz na diminuição dos casos de hepatites virais e vem sendo adotada entre usuários de crack, cocaína aspirada e dependentes de álcool.

- A política brasileira está de acordo com as recomendações internacionais adotadas em diferentes fóruns internacionais, incluindo a Sessão Especial das Nações Unidas sobre HIV e Aids (UNGASS), que definiu a estratégia de redução de danos como prioritária no enfrentamento da epidemia da Aids. Está fundamentada no respeito aos direitos humanos, na redução do preconceito e na garantia, aos usuários de drogas, do direito à saúde e à cidadania.

- Observa-se que alguns dos termos utilizados no folheto são adaptações dos termos contidos nos manuais de redução de danos para usuários de drogas, usados como referência nas ações de prevenção que, em hipótese alguma, podem ser considerados como incentivo ao uso de drogas. Nesse sentido, o Programa Nacional de DST e Aids do Ministério da Saúde e a Coordenação Estadual de DST e Aids de São Paulo, da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo apóiam a decisão tomada pela Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo de suspender a distribuição do material, até que o mesmo seja avaliado tecnicamente.


Mariângela Simão-Diretora do Programa Nacional de DST e Aids


Maria Clara Gianna-Coordenadora de DST e Aids do Estado de São Paulo


Redação Agência de Notícias da Aids

Nota da REDUC sobre os recentes ataques à Redução de Danos


A REDUC - Rede Brasileira de Redução e Danos e Direitos Humanos, lamenta, novamente, a interpretação errônea da estratégia de redução de danos como uma política que incita o consumo de drogas. A proposta da ONU de um mundo sem drogas até 2008, onde o Brasil é signatário, evidentemente não foi atingida e diante desta realidade, cabe a nós, profissionais de saúde, educação, Direitos Humanos, miltantes do movimento de redução de danos optarmos: ou fingimos que não há nenhum consumo de drogas sintéticas ou outras drogas em danceterias e deixamos as pessoas se desidratarem, usarem de forma letal a droga, ou optamos pelo cumprimento de nosso papel: favorecer o acesso às informações que primam pela saúde, a fim de salvarmos vidas.Fica nosso protesto a não veiculação da cartilha sobre uso seguro de drogas sintéticas e nosso apoio ao projeto Baladaboa.

Fapesp suspende apoio a projeto de redução de danos do ecstasy

Folhetos financiados pela fundação orientavam sobre consumo da droga

Ricardo Westin

A Fapesp, órgão do governo de São Paulo de financiamento de estudos científicos, suspendeu ontem a liberação de verbas para o projeto de uma pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP) que incluía a distribuição de folhetos a consumidores de ecstasy, uma droga ilegal. Esses folhetos dão dicas de como reduzir os riscos do consumo da droga - uma delas é tomar metade da dose, esperar os efeitos e só depois decidir se toma ou não a outra metade. A Fapesp decidirá se libera ou não as verbas após investigar “as graves denúncias veiculadas pela imprensa”. A notícia foi publicada pelo site G1.

O trabalho em questão utiliza uma estratégia da saúde pública que tenta reduzir os danos à saúde decorrentes de práticas de risco, como o uso de drogas. Já que sempre haverá pessoas adotando essas práticas, mesmo que ilegais, a idéia é que os males sejam pelo menos minimizados. É a chamada redução de danos. Sua forma mais conhecida é a distribuição de seringas descartáveis entre usuários de drogas injetáveis, como forma de impedir a disseminação de doenças como a aids e a hepatite C.

Essa abordagem é polêmica. Existem pessoas que vêem nela um incentivo a práticas de risco e ilegais. Nas últimas semanas, duas iniciativas semelhantes à da USP ganharam os noticiários após terem sido contestadas - uma envolvendo drogas e outra, o aborto.

“Isso é um equívoco. A redução de danos não é uma apologia ao uso de drogas”, afirma a psicóloga Stella Pereira de Almeida, a responsável pelo programa que distribuiu em boates os folhetos sobre o ecstasy. Ela faz uma comparação com a distribuição de preservativos anos atrás: “Antigamente, acreditava-se que a distribuição de camisinhas incentivaria a promiscuidade. Não foi isso o que aconteceu.”

Segundo o psiquiatra Marcelo Niel, esse tipo de campanha é importante porque, em decorrência das informações, leva os viciados a procurar ajuda médica. “As cartilhas falam sobre os riscos de morte, de complicações, de intoxicação grave, de contrair doenças... Quando tomam conhecimento de todos os riscos, essas pessoas podem em algum momento optar pelo tratamento”, explica Niel, um dos coordenadores do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (Proad), da Unifesp.

O Ministério da Saúde tem e apóia programas de redução de danos. Para defendê-los, cita números decorrentes da distribuição de seringas descartáveis: em 1994, 21,4% dos casos de aids no País tinham relação com o uso de drogas injetáveis; em 2006, o índice foi de 9,8%.

No entanto, para o psiquiatra Ronaldo Laranjeira, coordenador da Unidade de Álcool e Drogas (Uniad) da Unifesp, os programas brasileiros de redução de danos são “caricaturais”. “Não fazem sentido, já que o governo não faz campanha de prevenção nem oferece locais de tratamento para os dependentes.”

O infectologista David Uip, do Incor, diz que cartilhas só fazem sentido se forem distribuídas a um grupo de tamanho definido e depois acompanhado por um tempo. “Não podem ser distribuídas aleatoriamente. Usar droga é crime e ponto.”


OUTROS CASOS RECENTES

Cartilhas da Parada Gay:
Os organizadores da Parada Gay de São Paulo, realizada há dois finais de semana, pretendiam distribuir cartilhas com dicas sobre como usar drogas. Para evitar a transmissão de doenças, recomendava-se não usar notas de dinheiro enroladas para cheirar cocaína - o indicado era utilizar canudos individuais - e não compartilhar cigarros de maconha. Os panfletos, com as marcas do Estado, da Prefeitura e do Ministério da Saúde, foram recolhidos dois dias antes pelos organizadores do evento

Orientações sobre aborto: Uma ONG de Campinas lançou um projeto na cidade para orientar mulheres interessadas em fazer aborto sobre os métodos existentes e seus riscos. Entre os tipos explicados, estava o uso do medicamento misoprostol, vendido como Cytotec e utilizado no tratamento de problemas gástricos. No final do mês passado, o Ministério Público do Estado de São Paulo pediu a abertura de um inquérito policial para apurar suposta apologia ao crime. O aborto, fora dois casos previstos, é ilegal no Brasil

sábado, 16 de junho de 2007

CARD DE REDUÇÃO DE DANOS PARA LISÉRGICOS

CARD DE REDUÇÃO DE DANOS PARA ECSTASY

Balance na AURORA

Uma nova perspectiva


05/04/2007 às 10:42


Coletivo Balance

Tatiana Mendonça

Se beber, não dirija. E se for usar ecstasy, tome só a metade. Você prefere o Diga não às drogas? Pois tem um monte de gente que acredita que essa é uma guerra perdida. Porque desde o começo dos tempos o homem usa drogas, mesmo que a lei diga que é proibido. Porque acredita que as pessoas têm a liberdade de escolher de que maneira querem viver as suas vidas, e a abstenção é um dos caminhos, não o único.

A lógica se inverte e vira uma questão de aprender a lidar. Por isso, na próxima vez que você for a algum Universo Paralello, não se espante se alguém aparecer no meio da música barulhenta e te der um cartão escrito "Se for consumir, tome só a metade e, depois do efeito, decida se quer tomar a outra parte". Esse movimento tem nome: redução de danos. Fazer com que o uso de drogas não se torne abuso e seja o menos prejudicial possível à saúde. Sem moralismo.

Ele ganhou mais visibilidade  e apoio do governo  com o combate à Aids. "Aquela história de dar seringa descartável, né?", alguém vai dizer. Mas não começou aí, nem se resume a isso.

Primeiro, informar sobre os efeitos da droga. Depois, evitar o envolvimento precoce. Para os usuários, orientação para reduzir os prejuízos à saúde e evitar que se tornem dependentes. Para os dependentes, modificar o padrão de uso, oferecendo a possibilidade de substituição por drogas de uso menos danoso, sem excluir a possibilidade da abstinência.

O psiquiatra Luiz Alberto Tavares, do Centro de Estudos e Terapia do Abuso de Drogas [Ufba], explica melhor essa história. "Não é chegar para o usuário e dizer: Troque o crack pela maconha. O que fazemos é facilitar a escolha por drogas menos danosas. A abstinência não é a condição para o tratamento, mas pode ser um fim. Existem pessoas que não querem deixar de usar drogas, e elas continuam tendo direitos".

Para o antropólogo e pesquisador do Cetad Edward MacRae, o uso está ligado a um desejo de transgressão, enquanto as campanhas tentam convencer pela repressão. "É mais eficaz chegar de uma forma compreensiva, dialogar. Por que ao invés de fazer assim você não faz assado, pra você não se perder na sua curtição?".

Vítima - A imagem que se tem das pessoas que usam drogas é que são viciados que não conseguem se controlar. Então como seriam capazes de reduzir danos? Para Luiz, os usuários tendem a ser vistos pela lógica da culpa, do desvio social ou da vitimização. "Aqui nós trabalhamos com a responsabilização do sujeito, que responde pelo seu caminho e por seus desejos".

Para Edward, é preciso considerar as dimensões sociais e psicológicas do uso de drogas. "Não dá pra só falar em compulsão. Muitas vezes é curtição mesmo. Sem esquecer que determinados padrões de comportamento persistem, é o controle social informal que opera. A redução de danos trabalha nessa lógica, do controle pelos amigos, familiares, vizinhos".

No imbróglio que é a questão das drogas no Brasil, enquanto uns fingem que não vêem e outros morrem de verdade, os redutores muitas vezes são confundidos com incentivadores. Mas a Secretaria Nacional Antidrogas já reconheceu seu papel como agentes de saúde.

>> Balance monitora cena trance

No meio da música altíssima, do monte de gente ligada horas [dias] a fio, invariavelmente está o stand do Coletivo Balance, pioneiro na cena eletrônica do País. O que eles fazem? Redução de danos.

No Universo Paralello [rave que durou sete dias e reuniu 10 mil pessoas no reveillón de 2007, em Pratigí, BA], eles pegaram seus banners, filmes e cards para participar da festa. As orientações vão de "use protetor solar" e "beba água", conselhos de qualquer mãe, até o "tome só a metade".

O coletivo começou no meio do ano passado, a partir da pesquisa de doutorado de Marcelo Andrade, que está estudando o uso de substâncias psicoativas na cena trance. E para fazer jus ao nome, reúne DJs, produtores, profissionais da área de saúde, antropólogos.

Além de informar sobre o uso de drogas, lícitas e ilícitas, eles atendem, nos postos de saúde, as bad trips, pessoas com quadros psíquicos de ansiedade aguda e estados dissociativos. "Mas o número de gente muito alterada é bem pequeno. No Universo Paralello não chegou nem a 10", diz Marcelo.

>> Governador quer legalizar drogas

Legalize já. Marcelo D2? Não, Sérgio Cabral, governador do Rio. Em entrevista à Época [26/03], Cabral disse que o efeito da proibição da droga é "devastador" nos países pobres. "Se a gente for quantificar os mortos por conta da proibição da droga, o total é esmagadoramente maior do que os mortos por conta do uso da droga", argumentou.

Para Edward, a criminalização do uso de drogas teve o efeito de baixar a idade de uso. "Em 1900, os usuários eram as pessoas de meia-idade, da classe média. A criminalização foi a porta para a rebeldia da juventude. A relação com o mundo depende da forma como as coisas são apresentadas".

Em maio, Salvador sedia a Marcha Mundial pela Regulamentação da Maconha. A primeira edição foi em 1999, em Nova York. Vale lembrar que a nova lei não descriminaliza o uso. Só deixa de prever a prisão como pena.


Redução de Danos

Redução de Danos é um conjunto de ações educativas e de saúde que tem como objetivo diminuir os efeitos negativos decorrentes do uso de substâncias psicoativas.

"Balance" significa "equilibrar-se, compensar-se". O trabalho do balance é pioneiro na cena eletrônica nacional. Buscou inspiração nos trabalhos do Energy Control (Espanha) e MAPs (EUA). O grupo chega para quebrar o estigma que envolve a cena eletrônica através da abordagem negativa da mídia de massa e repressiva do controle policial tem dispensado ao tema.

Para isso, o Balance conta com o apoio e participação do GIESP e do CETAD /UFBA. Assim, reunimos profissionais como psicólogos, médicos, antropólogos e outros pesquisadores, da questão das substâncias psicoativas, bem como produtores e cidadãos da cena eletrônica para pensar e realizar ações de redução de danos.

"Não devemos confundir as estratégias de redução de danos com incentivo ao uso indevido de drogas ilícitas, pois se trata de uma estratégia de prevenção."